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26 de fevereiro de 2012

As veias falam

Não caminham no sentido contrário do seu
você caminha em seu sentido, contrário.
É uma questão de não-lógica
onde a doença está em seu comportamento.

(fico aqui olhando o meu espelho, perdida em toda gosma que sou. Me perco de mim quase sempre, e ainda fico achando lindo quem se procura, como se este fosse um estágio que chegarei, uma desculpa de mim, do que sou, do labirinto que vivo. Nunca pensei dessa forma, vista por um texto de auto-ajuda _tipo de coisa que odeio_ enviado via mensagem rápida da rede social em que me mostro. Ando não fazendo sentido, decidi que não quero mais me permitir, não quero mais ser. Chega de fala, a boca aberta demais embrulha o estômago que embrulha com o cheiro do café que quase todas as casas servem. Não quero me servir de mais nada. Quero morrer de fome, quero ser como alguém qualquer, chega de querer demais. Simplifico, deixo de ser. Não sou, não vou, não insisto).

25 de fevereiro de 2012

Ausência de margem, é isso que é

As margens se perdem, como podem se perder? Começou pelas margens, pelo contorno que delimitava forma, e caiu em queda livre fazendo barulho de chuva no asfalto fodido de uma rua qualquer da zona sul de São Paulo. Em uma rua com árvores, muitas árvores e pouca luz. Dizia adeus a mais um pedaço que era seu, água da chuva virou esgoto.

Quanto maior o silêncio, maior o rompimento, o corte, a fenda, a rachadura do cristal. É daquela gente que se rasga inteira por um sonho, por um cheiro que nem gosto tinha, ou por um gosto provado tão rapidamente que talvez até, provável até, certo até que mudaria de sabor. Talvez não uva, talvez não tão doce com aquele azedinho no fim.

Mais uma vez, a tentativa de jogar o jogo que a regra principal é não ter ganhadores. Perderás, enquanto andar sem pele, ser mordida por formigas e ser vomitada por jogadores já perdedores de outras guerras. Flagelo. Não poderia nunca ser diferente, nunca!

Andar por aí sem pele, sem margens, sem comandar bem a sombra, sem regular sonho, sem ter na sacola um "não" para a própria dúvida, a própria esperança vã de abraçar o mundo concreto sem ter margens. Digna de pena aquela moça que anda pelas ruas das árvores e com pouca luz.

Falaram pra ela. Estão falando agora, mas o que adianta? Não se escolhe ser cachoeira aberta, ser um rio ambulante sem margem, sem a essência que fala... dizem sempre que precisa ser mais racional. Enquanto lá dentro, o mundo gira o tempo inteiro, mudando de tom, mudando de gente, vestimenta, roupa, touca, boca, jeito, cheiro. Ela sempre soube que nunca fora boa para administrar coisa nenhuma, nem os próprios segredos, nunca.

Vejo-a agora, se tecendo em frente à uma tela branca, e cada palavra fundada lembra uma fenda aberta em seu rio sem margens. Digna de pena, de pena. O amor é coisa para poucos, a sorte, a vista grossa, o pouquinho que a vida dá. Lá vai ela, cambaleando em um choro sentido, escorrendo por dentro e por fora. Querendo sumir, vai mutando, até que a água seque e a ausência de margem não faça diferença, a morte. Por enquanto, é esgoto que corre fazendo barulho no cimento fodido na zona sul de São Paulo, em uma rua cheia de árvores com pouca luz.

21 de fevereiro de 2012

Sinceridade é uma garra, uma bala da arma chamada amor. Andam sobre os pelos arrepiados abrindo cicatrizes, e quem disse que queremos parar?

Com garras e balas, umas mais leves, outras mais claras; abrem filetes em nossas costas fadigadas, não queremos deixar de amar o cuidado, a bondade, o que é doce. Com música ritmada, abismo grande se abre; buracos se contrapõem, alinhando as cicatrizes.

Pelo silêncio que paira, as costas ardem enquanto a boca cala. Não treme mais, ela cala e acabou a história!

19 de fevereiro de 2012

Bloco de carnaval

Sobe no palco que não é seu
sai de um mundo em que és barro
vira atriz
sorri.

Flutua
escancara a vereda da vida
se arde, se mostra
é!

Na multidão, você não é você
todos são você!
Completos, felizes
puros.

Alívio que se instala, se acomoda
se ajeita nas quimeras
se embrenha nas angústias
resolve tudo.

E quem há de negar
mesmo que acabe
a purpurina dura
vira memória concreta.

Ser isso é ser algo
é ter algo
é estar no meio da gente
é sentir-se sendo algo.

17 de fevereiro de 2012

Fora da casa, um mundo que respira sem licença. De um beijo bom que despede, de um "beijo bom" que sem permissão chega. De um lado arranha, de um outro afaga. Não é confuso, é a vida de poesia rasgada, bonita e sangrada como é. Percebida por quem anda pelas ruas sem pele, sugando tudo aquilo que é tocado pelo ar.

13 de fevereiro de 2012

11 de fevereiro de 2012

Suscetível

As árvores, a divisão da palavra e o abismo inteiro suspenso em uma frase do Oswald de Andrade, que era nós. Pensei que o tempo, onde ele estava podia ficar pra sempre. Nem sei se muito por mim ou por ela que encostou no banco da praça, e docemente me olhou escorada no encosto do banco da praça. Quase em mim, nua eu estava. E vi, quão só me sentia, e quão bem e acomodada em seu sotaque eu estava. O melhor flerte que já me permitiram.

Esqueci de uma das casas que a paixão me ocupa, lembrei do que era me sentir fielmente dividindo as minhas dores, minhas dúvidas.


Eu não ria assim, não me distraía assim. O tempo foi fechando e mais os meus olhos iam curiar aquela alma, e quando vi já era o tempo de entender nada em mim. Se entrei pra dentro de mim por ela, ou se me coloquei pra fora para ficar ao lado dela, não sei. Só ficou macio, até o meu olhar, macio.

Paro o texto, sinto o cheiro do rapaz que passou na calçada do bar. Lembro da minha casa dolorida, de que não posso mais habitar e de que abandoná-la está sendo veladamente doloroso.

Uma gota que escorreu do primeiro copo de cerveja, caiu na perna dela. E na perna reparei, nos olhos e no discreto par de seios. Calei meus olhos e falei com as energias que ficaram aqui. Ali no ato, já queria estar dentro dela, acalmar tudo e fazer dali um laboratório de sonhos novos. Quis ter a palavra inspiradora que fizesse sentir-se amada, um pouco mais feliz.

Agradável ela se fez e existiu em mim. A chuva e os carros, passavam e paravam no sinal vermelho na rua do bar. Vermelha boca, chuva e isso lindo, é o que me resta.

9 de fevereiro de 2012

Foi alguém que deixou a brisa, alguém que me comoveu, pelos olhos que abrem abismos, com colo quente e inteligência

Um dia alguém me falou da vida como ela era, me mostrou um texto meio seco sem rima, e me respondeu de forma prática uma dúvida que era eu. Em um plano do avesso do avesso sonhei a realidade desse alguém, e confortavelmente chorei, confortavelmente sorri. Era lindo ver inebriar meu caos, embebedar-me a razão e virar de costas.

:)

5 de fevereiro de 2012

"Não queremos mais guardar silêncio" - Lira

Já foram muitos baldes para colher toda a inundação
para recolher todo o estrago da astuta tradição
da fé que ousaram aprisionar nas regras,
que ousaram condenar
Tudo aquilo que não estivesse estreito o suficiente.

Foram tantos baldes e tantos afogamentos.
muitos mortos, muitos desaparecidos e inúmeros cortes e sequelas,
que até hoje, permanecem sem cura, sem cicatrizar.

E depois de tanto colher as gotas, e de tanto retirar a lama...
volta com fúria toda água da mesma fé
condenadora, opressora, de um sistema lacrimal que promove o regresso.

A fuga de quem busca a paz, a omissão dos oprimidos. Na lembrança, o santuário iluminado cheira desejo reprimido. Já não existe sonhos nossos lá, então nos deixem sonhar aqui fora.


4 de fevereiro de 2012

É como entornar a taça de vinho em minha roupa limpa, e como sempre faço, esfrego uma parte na outra para tirar o excesso. Não importa que eu esteja suja, só para prevenir uma eterna e futura mancha. Mas era tão bom brincar de manchar as paredes da taça e fingir que derramaria aquele coágulo pra fora do recipiente de vidro.

Depois de derramar o vinho, derramei a taça e terminei, sem querer terminar... Terminei a taça em cacos sobre mim, sobre minha roupa limpa. Fui tirar os cacos, cortei um dedo, cortei a pontinha do indica-dor e quando vi, minha palma era toda sangue. O sangue cheirava bem e não manchou a parede branca do comodo que não era meu. Sujou só em mim, e cortou só em mim.

E ali eu fiquei, encolhida de vergonha. Com a dor de ter o vinho misturado com sangue, e cacos, muitos cacos. Fora de mim, um sonho grande suicida se decompõe, e me decompõe junto também. E junto, nada mais. Nem os cacos, nem os cacos, os cacos, e nem, cacos, nem, cacos. Nem.

2 de fevereiro de 2012

Por aqui...

Tecerei com lágrimas, com palavras (as mesmas) que sou. Lá fora tudo dói, o vento me arrepia os pelos dos braços, e dói. E dói. Aqui é como sentar na cadeira de balanço, sentir medo, mas me conforto com as minhas reflexões, a dor mais fácil de ser compreendida. A minha dor.

O clichê, que eu carrego nas conversas curtas que as pessoas cultas não entendem. É muita ignorância para uma pessoa só, sou só ignorância. Sou a covardia em pessoa, covardia tamanha que fecha durante vagas e várias horas do dia comprido, cumprido. Pessoa covarde que só se acalma aqui, por aqui.

Flor de laranjeira que bebi, fervida na água quente para me acalmar...

Flor de laranjeira, que perfumada noite, umedece a pele. Pedaço desgarrado de árvore que invade quintal a quintal. Te vemos vagando um vôo singular que alcança orvalho dos novos corpos com que se deita.

Flor de laranjeira, que bate no vidro da janela toda noite e chora um choro sentido que inunda o quarto escorrendo por debaixo da porta. Quer entrar deprimida e inebriar os sonhos dispersos.

Flor de laranjeira, de cor e cheiro vivo, imergi angústias, submergi sonhos e ousa desenhar um novo desenho com capricho, e com cuidado, zelo e apego. É. Se fez a mais bonita Flor de laranjeira plantada no quintal do meu vizinho.