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29 de maio de 2012

Condecorar cada lágrima que derramei naquela praça, adoração à minha dor que desenhou meus olhos mais grandes na última madrugada. Meu sal na face, a razão que deixa a quimera ir. Intocado, aquilo tudo foi-se embora entre clamores, gemidos de dor e prazer que infernizaram por horas a minha mente. Agora mais leves, mas ainda aqui. 

O universo assiste o doloroso processo. Um cd novo, um poeta novo, um milhão de ideias e sonhos que riem de tudo. Um mar salgado se forma, um completo caos. Sem margens, sem barcos, vem vencedores. Arranho os vidros, a minha redoma. A minha poesia jogada no vento. A lua linda que eu sempre falava também assistiu cada cena, cada monte e desmonte. Teci descaminhos, eu teci por conta da dor, de ser incapaz de resolver o mundo. Pequena demais. Meu mundo dorme mais um cochilo, meu quarto em mar, enquanto arranho os vidros. Trabalhada em minha pequinês, fui ali afogar de mim, mais um pedaço. 

26 de maio de 2012

Revirar

Lembro apenas da cozinha apertada, menos de três metros entre um móvel e outro; mesa, armário e geladeira deixavam todos unidos na hora do almoço. Na pia, um cesto de lixo bem pequeno, um escorredor bem antigo de aço e algumas escumadeiras penduradas. Me entristece esquecer a cor do cesto, vivia a lavá-lo entre conversar, risos, lamentos e conselhos.

Aquele azulejo antigo, fazia-me sentir em uma casa que habitava desde pequena. O tapete da sala, a bela cortina lilás e as banquetinhas especiais para as crianças que vinham. E a mesinha azul? A proteção atrás das portas para que não batessem, as fotos na estante, os sofás sempre forrados com cochas de cores sortidas, muitas almofadas e tapetes pequenos na beira do fogão...

Pela manhã, a gente gostava de sentar na cadeira perto do refrigerador, comer torrada com geleia ou pão de forma bem dourado na torradeira (também antiga). No banheiro, uma escova verde, só minha, e o sabonete facial que  eu também usava. Tinha um esquema para o chuveiro funcionar, me lembro de tantas vezes que precisei de ajuda para que ele funcionasse... A memória me revira.

É indescritível o acolhimento que me prepararam, e hoje eu lembro do gosto que tinha. Com direito a panqueca de frango e macarrão, torta de limão e nenhum olhar opressor sob mim; alguma bronca pelo horário, mas só. Deus (a bondade) me deu essa recordação, que com tanto carinho guardo, e com tanto amor hoje, relembro.

DECIFRA-ME OU TE DEVORO

Tens um ponto na orelha que sussurra diariamente "Decifra-me ou te devoro". Relembra a paridade com Édipo, intrínseca nos textos da adolescência, e hoje palpáveis, abusadamente mordidos e mastigados nas relações sociais, nos sonhos e na grandeza dos abismos que visita (diariamente).

A existência é uma vertigem sem gozo, sem querer absoluto. O viver em, o estar no, a ida ao, a viagem para... sempre parecem o start que alguém te deu (com tapinha nas costas). As coisas belas se perdem tantas vezes, as frases dedicadas, o encontro das peles... Esse script que cada um segue é tecido com arames, e isso é necessário não permitir, não aceitar, quebrar o mundo e passar por cima da mitologia universal. 

Quase sempre não responder ao enigma se torna um amontoado de palavras, de escrita sem razão. Mesmo assim, nesse viés (aparentemente justo) não se corta menos quanto acontece entre os personagens quando diante da Esfinge.

24 de maio de 2012

DO QUERER

O corpo todo formigando, por dentro as paredes encharcadas e alguns dos nervos com inflamação. O que palpita, relembra tudo como se este fosse o momento real que os fatos aconteceram.

E quais são os fatos, o que é tão importante ao ponto de fazer daquele corpo um pedaço de trapo rasgado, sangrando em um pedido infernal, por um tocar de olhar deitado sobre a estranha pele? Um pouco doloridas, as mãos, a face, a boca, o olhar nu na plenitude de um desejo. A necessidade é de palavra, versos recitados pra dentro daquela boca.

Onde estarão os freios que seu silêncio pede? Onde guardam a chave dessa pele dela, intocada por dentro, não conhecida mais profundamente, mesmo por aqueles que entraram?

Onde mora o sorriso, a cama em que deita, o segredo do murmúrio que impede o complemento de suas frases? Onde é o ponto fraco destas lágrimas para que as flores daqui possam crescer e ocultar?

Por que ainda esconde o corpo? Por que priva o mundo de sua voz doce? Por que aquela alma se guarda assim, longe do mundo simples que sestas palavras apresentam? Por quê?

Por que céu? Por que grão? Por que som? Por que ainda tentar (.), (?)? 

22 de maio de 2012

o clichê "tempo"

Um dia, qualquer ser já desenhou um sol no pedaço branco de papel. Estudou o feudalismo, debateu escolas literárias, comentou sobre o despertador, bateu o ponto, falou que não dava mais tempo: mediu períodos!

Que a vida não te seja ampulheta imaginária, que te serve para moldar os passos em constante desespero. Que o teu sonho não se esgote nessa areia contada, que cabe a um alguém de olhos atentos, longe dos seus sonhos, alguém que conta seu tempo sem você, grão a grão, pois que as mais doces e sublimes fantasias se ocupam de períodos não-matéria, não obstante então.

Enquanto o motor do carro cheio de portas, cheio de rampas, de eletro-facilitadores pelas casas, pelos terminais e pelos bancos que guardam preciosos sonhos. Coisa triste é medir período! Porque período é sempre coisa vinda sem controle, com metas e com motivos que catalogam o que somos, sem a gente querer ser, ou ir, ou vir, ou simplesmente não ser. 

Viver não é a parte difícil, desafio é olhar todos os dias os mesmos ponteiros e ver além do que aponta o calendário. Os prazos que nos destroem quando não cumpridos, os níveis que um manual imaginário impõe e gasta a nossa pele que se retrai. E a raça humana se escraviza do próprio tempo que cria, e morre pensando que venceu mais um dia. O clichê "tempo".

17 de maio de 2012

As cenas bonitas e "ocultas"

Ouve-se o barulho do mar, enquanto a cabeleira encaracolada atravessa e levemente toca o vento. As covinhas em um rosto macio de menina, sentindo nos pés as pedrinhas da areia fina que a maré não toca.

Sozinha e sem medo, a menina corre coberta pelo céu limpo e azul. Tem sol e a brisa é leve, a maré é calma em plenitude.

Vestidinho solto, em movimento circular.

Valsando na areia da praia, uma criança sem margem na beira da praia. Toca leve a imensidão e sorri, indescritivelmente.


_*OCULTO, tudo aquilo que se fantasia para apaziguar a ventania. Um sonho, uma saudade, uma projeção intocada, distante e perto - quase sempre. Véu que embala alma.

2 de maio de 2012

Tudo
fica 
tão triste
quando 
não cabe 
no meu
dia
esse 
espaço.
Que cultuo
como a coisa
mais preciosa que tenho.

Enquanto isso, no lustre do castelo, versos se perdem no bloco de notas. Guardam o que escorre, e só. Mais um tempo que se perde.